Sem sombra de dúvidas os Livros de Dzyan divulgados na Doutrina Secreta de H. P. Blavatsky, representam uma das obras mais herméticas que existem. Tal é o grau de dificuldade que a obra faz poucas concessões seja ao leitor comum ou ao mais instruído. Para todos eles deparar-se com tais textos assemelha-se a tentar penetrar numa floresta tropical repleta de lianas e de espinhos que detém o seu passo a cada centímetro. Tal é a concentração de símbolos existentes: números, geometrias, metáforas, etc.
Paradoxalmente, estudar os seus hermeneutas tampouco parece ajudar muito no entendimento dos seus mistérios. Não são raros os teósofos antigos que o tem tentado uma e outra vez, apenas para repetir a sua frustração. Na falta do apelo ao entendimento, muitos decidem simplesmente aceitar o dado como pronto e elegem o texto como um estatuto de fé. Um novo credo nasce assim, ignorando as advertências dadas. Como se a Autora não insistisse a cada passo que estava lidando com matéria secreta, que muitos véus todavia existiam e alguns sequer tinha-se qualquer sombra de solução em sua época. Com efeito, tudo sugere que em Blavatsky temos uma expressão daquela leitura conhecida da palavra “revelação”, no sentido de meramente renovar os véus.
Como chamam-se afinal as grandes obras de HPB?! “O Véu de Ísis” era o nome original de “Ísis sem Véu”, e a outra é “A Doutrina Secreta”. Estes nomes sugerem que Blavatsky nunca teve a intenção de revelar verdadeiramente conhecimentos, e sim de comentar extensamente sobre os Mistérios. Com efeito Blavatsky mesma informa que todos os trabalhos de “hermenêutica” existentes em torno dos manuscritos originais das Estâncias de Dzyan, sejam esotéricos ou exotéricos, recebem o nome de “comentários”. Por tudo isto, abundam da sua parte alusões à existência de véus nestes trabalhos.
Desvelar algo é diferente, é tornar uma informação acessível à razão e sujeita à instrumentalização. No verdadeiro ocultismo nada existe que não tenha uma mensagem prática e atual para o estudante. Portanto o estudante prudente faria bem em ver nos esforços de Blavatsky não um desvelamento completo dos misteriosos textos de Dzyan, e sim uma série de indícios sobre os seus conteúdos.
É claro que saber tais coisas ainda não ajudam muito o leitor interessado nas verdadeiras respostas. Tudo o que se pode esperar nesta altura é preparar o espírito para a verdadeira jornada. Com efeito pouco ajuda a avançar se não contamos com um mínimo de apoios para tal: uma bússola, um mapa, indicações, referências, etc. Contudo mesmo muitos dos instrumentos comuns ao investigador nos são privados aqui: origens, forma de registro, contexto, destinação… tudo o que é oferecido parece servir mais para desviar o olhar do que realmente para apurar o foco. No entanto, a esta altura parte do caminho tem sido já relativamente limpo. Nos tempos de Blavatsky tais documentos poderiam estar envoltos em grandes lendas e mistérios, porém não tanto atualmente.
Já soa como estabelecido que estamos diante da reprodução de antigos manuscritos tântricos. Não se trata de nenhuma antiguidade tão excepcional, mas sim de documentos de padrão tradicional em amplas regiões do Oriente, gravados em folhas de palmeiras e bem preservados pelo clima dos Himalaias. O teor dos escritos não estão bem identificados mas apresentam pontos em comum com textos conhecidos do sistema Kalachakra ou da “Roda do Tempo” - com efeito uma das palavras que mais aparecem ali são “rodas”, grandes e pequenas, remetendo às visões de Ezequiel sobre “rodas dentro de rodas”.
Numa primeira leitura do tema, parece estarmos portanto diante de algum misterioso compêndio astrológico ou mesmo astronômico. Porém um olhar mais arguto poderia permitir pensar sobre os tempos em que as rodas aparecem, então estaríamos diante de uma cosmologia, que pode ser tanto no macrocosmo como no microcosmo - ou seja: em termos de chakras, também chamados de “rodas” no Tibet. Seja como for, a melhor forma de abordar um documento tântrico será de teor ocultista.
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| Símbolo do Kalachakra |
Blavatsky trabalhou muito na verdade com uma leitura de mesocosmo, quer dizer: a esfera intermediária das “raças”. Ainda assim os resultados de seus esforços resultaram vagos, denunciando as complexidades da linguagem. Com efeito os Livros de Dzyan não entregam facilmente os seus mistérios. Para um leitor budista o texto soará difícil porque está repleto de termos hinduístas, ao passo que se considera no geral o Kalachakra como um tantra tibetano. No entanto muitos tantras foram elaborados a partir da Índia ou mesmo do Nepal. Talvez os Livros de Dzyan tenham preservado ainda muito dos seus conteúdos originais, o que apenas reforça a sua preciosidade. Neste caso seria importante que ele seja analisado por hindus também e não apenas por budistas.
E com efeito, será à luz do hinduísmo que muitas respostas poderão ser finalmente encontradas. As enigmáticas alusões às “raças” de Blavatsky podem ser razoavelmente compreendidas tanto à luz do sistema de ashramas ou etapas-de-vida do Brahmanismo,(1) como também do sistema iniciático hindu, como sugerem termos como “Hansa” (nome da terceira iniciação) no contexto da “terceira raça”, entre outros atributos mentais, técnicos e iniciáticos comuns. Os ashramas védicos representam uma ciência espiritual de perfeito aproveitamento do espaço-tempo, sendo assim uma socialização dos conhecimentos da Escolas Iniciáticas.
Tudo isto pode nos colocar num contexto tanto iniciático como sociológico ou antropológico. Na sequência encontramos uma série de narrativas sobre conflitos sociais, entre seguidores dos Construtores e os recalcitrantes, naquilo que podemos considerar como os processos de transição de “rondas”, quer dizer: a chegada da quarta ronda, ou de uma nova “grande roda” nos termos dados.(2) A literatura Kalachakra é muito importante no Tibet e tem inspirado grandes sagas através de mitos envolvendo os reis sagrados de Shambhala à luz das profecias da vinda do avatar Kalki. Portanto o contexto profético do texto não pode ser negligenciado.
Provavelmente várias interpretações podem ser realizadas em torno a isto, tal como se costuma fazer com outros épicos hindus. Blavatsky amparou-se também nos Puranas da Índia, além de trazer a linguagem da antropologia racial de sua época, combinada com mitos ocidentais e elementos evolucionistas modernos.
Tudo parece sugerir que Blavatsky contava ainda com poucos recursos hermenêuticos, pois os livros tradicionais do Oriente recém estavam começando a serem traduzidos em sua época. Neste aspecto é que se destacam melhor como bem-sucedidos na sua produção os esforços realizados em torno da literatura Mahayana tibetana, por assim dizer, como é o caso da “Voz do Silêncio”. O verdadeiro tantrismo é necessariamente oculto e suas chaves apenas são dadas diretamente de mestre a discípulo. Conta-se que Blavatsky teria finalmente conseguido adentrar o Tibet após muitas tentativas, recebendo lá iniciações e instruções. Contudo não há provas reais disto e os resultados dos seus trabalhos também são por vezes nebulosos.
Hoje em dia seguramente existem muito mais recursos à disposição para empreender a aventura de estudar as Estâncias de Dzyan. A importância da outorga desta obra ao Ocidente deve ser valorizada, como se os Mestres estivessem enviando uma informação importante através de um mensageiro de confiança. Não significa que o mensageiro fosse sequer o mais apto para traduzir o texto, ou que todas as chaves pudessem ser entregues num primeiro momento. Bastava então fornecer a informação e dar alguns indícios dos seus conteúdos.
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| Dalai Lama e Mandala Kalachakra |
Nada casualmente, mas até reforçando todo este contexto, o Dalai Lama tem afirmado que o Kakachakra representa um tantra especialmente importante para o Ocidente. E uma das razões para isto seria justamente em função das profecias que o envolvem. O próprio Tibet foi envolvido em profecias pelo XIII Dalai Lama que previu a sua invasão seguida pela fuga dos tibetanos e a difusão do Dharma no Ocidente.
Se você achou interessante estas considerações, tudo isto é melhor desenvolvido nos novos estudos que realizamos em torno das Estâncias de Dzyan através da obra “Chaves Secretas dos Livros de Dzyan”.
Notas:
1. As primeiras “raças” das Estâncias de Dzyan não seriam pois aquelas abstrações apresentadas na Doutrina Secreta, e sim iniciações ou ashramas (ou etapas-de-vida védicas) definidas na ordem tradicional: 1. Iogues reclusos, 2. Devotos/casados, 3. Iniciados/instrutores (Hansa no texto, nome da terceira iniciação).
2. Para nós trata-se da transição de um Pralaya para o Manvantara atual, ainda que Blavatsky prefira dar um entendimento específico e absolutos a estes termos. Não obstante existem muitas escalas de Manvantaras e de Pralaya, que são os dias e noites de Brahma. Na literatura hindu até mesmo a morte pessoal representa uma forma de Pralaya, seguido pelo Manvantara da próxima encarnação.
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Sobre o Autor
Luís A. W. Salvi (LAWS) é estudioso dos Mistérios Antigos há mais de 50 anos. Especialista nas Filosofias do Tempo e no Esoterismo Prático, desenvolve trabalhos também nas áreas do Perenialismo, da Psicologia Profunda, da Antropologia Esotérica, da Sociologia Holística e outros. Tem publicado já dezenas de obras pelo Editorial Agartha, além de manter o Canal Agartha wTV.




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