O conceito de Ciências Ocultas, que corresponde ao sânscrito Gupta Vidya, é naturalmente muito amplo e abrangente, envolvendo um vasto arco de conhecimentos que transita entre as energias mais negativas até as energias mais positivas. As razões de serem “ocultas” também podem ser muitas, desde o fato de envolverem energias subjetivas até a necessidade do seu sigilo por esta ou por aquela razão. Em função disto trata-se naturalmente de assunto não raramente ligado à fraude e à manipulação das consciências. Ainda assim ele é tão real e natural na existência humana, quanto a própria realidade desta humana existência, existindo ou até precedendo esta existência desde os seus primeiros dias, ligada diretamente às faculdades mágicas que a própria condição humana possui. Pode preceder a presença humana em vários sentidos, não apenas através das espécies primitivas de hominídeos que já tinham religião e cultos místicos, mas pela própria possibilidade da haver espíritos no planeta independentes da evolução das espécies Homo, através de outros reinos da Natureza e até mesmo advindos de outros planetas e dimensões do universo.
Em termos práticos o ocultismo deriva do próprio poder criador humano a partir da sua especial capacidade pensante e sua habilidade em interferir no universo tanto nos planos materiais como nos planos sutis. As formas de atuação naturalmente podem ser muitas, mas certamente conta-se para isto com a Lei do Carma e com a realidade das egrégoras criadas pelos usos e costumes. O certo porém é que o Ocultismo está baseado no trânsito e na comunicação entre o oculto e o manifesto, ou entre o físico e o sutil, tal como nas habilidades de manejar estas forças sutis a partir da manifestação, promovendo a mútua influência entre estes planos. De forma rigorosa a natureza humana é mágica por natureza, e o ocultismo meramente explora os seus potenciais latentes, tal como aquelas egrégoras já existentes.
Por tudo isto, as analogias dos mundos é coisa sempre ensinada nos saberes sagrados:
“Assim como é em cima é em baixo, assim como é em baixo é em cima, para que se manifeste o milagre da unidade das coisas.” (Tábua de Esmeraldas)
Outra sabedoria que importa ao estudante da Ciência Oculta, é compreender que “assim como é fora também é dentro”. Em outras palavras, as leis que servem ao universo exterior, também valem para o universo interior. Como exemplo prático, costumamos dizer que a formação das estrelas tem muito a dizer sobre a própria constituição do Espírito, dentro dos processos da iniciação em especial.
O mundo material é um espelho do mundo oculto e vice-versa. Muitos ocultistas eram cientistas diletantes pois observavam a Natureza para aprender sobre as coisas secretas. Os Elementos naturais, seus estados físicos em especial -sobretudo no tocante ao Fogo-, sempre orientou os trabalhos da Alquimia espiritual nos ambientes dos Mistérios.
E foi apenas em função das Analogias dos Mundos, que os Mistérios puderam ajudar muitas vezes a dar nascimento às próprias Ciências físicas... A partir disto, podemos ousar definir Gupta Vidya como “o trato com o invisível e o impalpável” –e sempre para além daquilo que a Ciência concreta também possa porventura pensar em aspirar nesta direção.
Existe inclusive a doutrina acerca da “invisibilidade” de certas elevadas questões como Shambhala ou Agartha, que Saint Yves d’Alveydre esclarece todavia ser inacessível apenas ao vulgo, ao não iniciado. E isto pelas mesmas razões pelas quais o ser humano que não cultiva as suas energias, tampouco é percebido pelas forças espirituais, como que não existindo de certa forma diante das coisas mais sutis, cuja “linguagem” é feita basicamente de energias. O próprio conceito de cultura em sua mais nobre acepção transita exclusivamente pelo sutil.
Os Três Fundamentos
Estudos sobre a matéria afirmam (provavelmente influenciados pela Teosofia) que os Três Grandes Fundamentos de Gupta Vidya, a “Ciência Secreta”, são:
a. A realidade dos Ciclos ou da Evolução;
b. O caráter Ontológico do Universo;
c. A Unidade intrínseca de todas as coisas.
Ou seja, apesar das transformações as coisas estão sujeitas, também existe um estado de Permanência em função desta essência ôntica inerente, uma vez que tudo seria em essência uma coisa só. Isto não significa porém que a morte ou a extinção não existam, uma vez que as transformações acontecem sempre em função de um Plano Maior que requer a contínua renovação ou evolução, tal como o afastamento daquilo que não serve em nenhuma medida aos Planos desta mesma evolução. Nisto não existe severidade, apenas justiça. Se alguém não acredita na Eternidade, e inclusive pratica continuamente atos contrários a ela, acaso a alma desta pessoa mereceria ser amparada pelas forças espirituais para seguir existindo -muitas vezes com o sacrifício de quem realmente merece, deseja e necessita deste auxílio providencial?!
O trato dos Mistérios resulta não obstante num desafio real e considerável, cuja dificuldade o estudante médio, e até mesmo aquele razoavelmente avançado, não alcança realmente estimar.
As energias inferiores, por ilusórias que sejam, sempre estão à espreita para distorcer as coisas através da auto-indulgência, do apego e da paixão. Os véus das ilusões são espessos e atacam em muitas frentes, conduzindo muitas vezes ao fetichismo das formas, por simples falta de referências internas (percepção) e exteriores (orientação).
Às vezes quer mesmo parecer que os Cientistas da Mente, os epistemólogos e os estruturalistas, estão mais próximos de compreender as realidades espirituais do que os próprios místicos, especialmente quando vemos a inclinação dos ditos esotéricos para a idolatria das formas.
Quão difícil resulta compreender, por exemplo, que a Astrologia representa a rigor uma linguagem simbólica para as estruturas subjetivas de energias, em diferentes planos de realidades –e que a sua atribuição aos astros não passaria mesmo de um véu?! Uma simples linguagem entregue ao leigo para administrar, mas que não resiste às provas dos fatos, desde o ponto de vista exterior. Afinal, inúmeras astrologias existem de forma totalmente descolada da Astronomia, senão algo muito incidentalmente.
E porque, da mesma forma, imaginar uma suposta “energia das formas” na geometria física ou na própria arquitetura sagrada, quando na verdade dever-se-ia investigar antes a própria forma-das-energias -se é que podemos usar tais termos para expressar a Geometria cósmica ou a organização natural do Espaço interno e exterior?
Enfim o entendimento das Realidades internas é raro, e por isto se diz ser “a Verdade é sempre superior às religiões”. Aqueles que seguem um caminho buscam retirar paulatinamente os seus véus para avançar. Por esta razão é que existe um consenso entre os verdadeiros adeptos de Gupta Vidya que melhor do que qualquer discurso são mesmo as práticas espirituais transformadoras...
E é importante ter isto claro, porque muita gente costuma confundir os Mistérios com o Sigilo, com os símbolos ou com os véus de linguagem em geral, achando que por envolver-se com certos códigos cifrados já estará no coração dos Mistérios...
O verdadeiro “segredo” dos Mistérios não está porém na sua criptografia, mas sim em seus próprios conteúdos ou, antes, nos véus que temos em nossa própria alma, para além mesmo de toda a questão de forma. Diante disto, soaria quase abusivo dificultar ainda mais as coisas através de linguagens cifradas...
O próprio texto claro e objetivo, muitas vezes demandará um intérprete habilidoso, e tanto mais –naturalmente- quanto se trate de questões filosóficas e subjetivas -e não deixa de ser curioso ver que o vulgo é quem mais mistifica as coisas e tende ao irracional. Boa arte da “Misteriosofia” existente, deriva da imaginação ou da interpretação do inexperto que -na falta de intérpretes idôneos-, impõe a sua própria leitura das questões tradicionais e espirituais, mormente eivada de reducionismos. Muitas vezes a verdade está pairando diante de todos, porém um simples véu ou tabu impede as pessoas de avançarem na sua direção. Contudo, sucede também, e não raramente, como no ditado que diz: “Ao olho despreparado a luz cega”...
As Quatro Divisões
Gupta Vidya é apenas um termo genérico para designar as Ciências Ocultas, que é o que significa então. Não obstante, Blavatsky fazia questão de distinguir entre Ocultismo e Ciências Ocultas. Em sua obra “Ocultismo Prático” busca apresentar aquelas que seriam as quatro principais ramas de Gupta Vidya, apenas para logo na sequência buscar selecionar dentre estas Ciências Ocultas aquela (supostamente) única que seria “positiva”. Citemos, pois,
“A palavra ‘Ocultismo’ certamente se presta a equívocos, traduzida como foi da palavra composta Gupta-Vidya, ‘Conhecimento Secreto’. Mas conhecimento de quê? Alguns dos termos sânscritos nos podem ajudar.
“Há quatro nomes (dentre muitos outros) para designar os vários tipos de Conhecimentos ou Ciências Esotéricas, mesmo nos Puranas exotéricos. Há (1) Yajña-Vidya, conhecimento dos poderes ocultos despertados na natureza pela realização de certas cerimônias e ritos religiosos. (2) Mahavidya, o ‘grande conhecimento’, a magia dos cabalistas e da adoração Tântrica, geralmente Feitiçaria da pior espécie. (3) Guhya-Vidya, conhecimento dos poderes místicos residentes no Som (Éter), conseqüentemente nos Mantras (preces cantadas ou encantamentos), que dependem do ritmo e da melodia usados; em outras palavras, uma performance mágica baseada no conhecimento das Forças da Natureza e suas correlações; e (4) Atma-Vidya, um termo que é traduzido simplesmente como ‘Conhecimento da Alma’, Sabedoria verdadeira pelos orientalistas, mas que significa muitíssimo mais.” (“Ocultismo Prático”, H. P. Blavatsky)
Não obstante significar “muitíssimo mais”, no “Glossário Teosófico” existe a seguinte lacônica definição: “Âtma-vidyâ (Sânscrito) Literalmente: ‘Conhecimento do Eu ou do Espírito’. A suprema forma do conhecimento espiritual.” Basta porém saber que se trata da busca do Eu Superior, a consciência da Alma, rumando pela linha do Vedanta.
Embora o parecer de HPB sobre a maioria dos Mistérios seja negativo -mais adiante está opinião chega a ser relativizada-, o texto oferece um quadro interessante de considerações. A sequência do texto classifica com severidade as restantes ciências:
“Atma-Vidya é, assim, o único tipo de Ocultismo que qualquer teósofo que admirasse ‘Luz no Caminho’, e que fosse sábio e altruísta, deveria esforçar-se por alcançar. Tudo o mais é apenas algum ramo das ‘Artes Ocultas’, i.e., artes baseadas no conhecimento da essência última de todas as coisas nos reinos da Natureza – tais como minerais, vegetais e animais – portanto das coisas pertencentes à esfera da natureza material, por mais que aquela essência possa ser invisível, e tenha escapado até agora à compreensão da Ciência.” (HPB, Op. cit.)
Contudo, para aquele que prioriza Atma-Vidya todo o resto pode ser legitimado na visão de HPB –é o que diz a sequência do texto:
“Atma-Vidya inclui todas elas e pode até mesmo usá-las eventualmente, para propósitos benéficos, mas não sem antes purificá-las de sua escória, e tomando o cuidado de destituí-las de todo elemento de motivação egoísta. (...) Os Siddhis (ou os poderes do Arhat) são reservados unicamente para aqueles que são capazes de consagrar sua vida, sujeitar-se aos terríveis sacrifícios exigidos por um tal treinamento, e sujeitar-se a eles ao pé da letra. Que eles saibam de uma vez por todas e lembrem sempre que o verdadeiro Ocultismo ou Teosofia é a ‘Grande Renúncia ao eu’, incondicional e absolutamente, tanto em pensamento como em ação.” (HPB, Op. cit.)
Não obstante, sadhanas não são sinônimos de Siddhis; ritos não são Siddhis, cultos não são Siddhis, e e mantras tampouco são Siddhis. Quase não faz sentido reunir um grupo de doutrinas (quase todas tântricas) onde apenas uma delas seja positiva, mesmo sob tal relativização. Vemos até certa lógica em classificar estas quatro ramas de Gupta Vidya de uma forma complementar –apesar da classificação abaixo ser muito genérica e tratar mais de ênfases -tal como no Tibet budista, as escolas indianas também foram se assimilando mutuamente:
1º grau: Plano Físico = Ritualística (Yajña-Vidya)
2º grau: Plano Emocional = Culto (Mahavidya)
3º grau: Plano Mental = Mantra (Guhya-Vidya)
4º grau: Plano Intuitivo = Meditação (Âtma-vidyâ)
Neste caso a “meditação pura” estaria apenas na última fase como a mais elevada, mas até por isto as restantes lhe serviriam de “escada”. A própria relativização de Blavatsky prova que as restantes Vidyas não são essencialmente “infernais”, bastaria ser orientadas e praticadas dentro da ética necessária. Não obstante Blavatsky seria pessimista a respeito. Citemos novamente:
“Qualquer homem ou mulher pode pôr-se a estudar uma ou todas das ‘Artes Ocultas’ acima especificadas sem qualquer grande preparação prévia, e mesmo sem adotar qualquer modo de vida demasiado restritivo. Poder-se-ia até mesmo prescindir de qualquer padrão elevado de moralidade. No último caso, certamente, as probabilidades são de dez para um que o estudante iria se transformar num tipo de feiticeiro razoável, e prestes a cair abruptamente na magia negra.” (HPB, Op. cit.)
Então estamos falando de uma situação realmente extrema, isenta de “qualquer padrão elevado de moralidade”. É verdade que os estudantes ocidentais de yoga não são os mais aptos na observação dos preceitos éticos que as yogas mesmas propõem na sua base, sendo esta uma das razões para a degeneração moral de certos praticantes. Citemos então:
“Poucos são altruístas o suficiente para sustentar essas práticas altruístas ensinadas nos tantras e, consequentemente, elas foram mantidas em segredo para evitar o uso indevido. Mas todos os conheciam, e os tantras budistas eram reverenciados em todo o Tibete como os repositórios dos métodos mais avançados conhecidos para alcançar o estado de Bodhisattva, para se tornar um servidor mundial.” (David Reigle, “O que são os Livros de Kiu-te?”, High Country Theosophist 9.2, Fevereiro de 1994: 2-9)
Uma das chaves para tudo isto –ao lado das próprias observâncias éticas- é justamente empreender uma prática progressiva e ordenada. Sem isto tampouco basta descartar certas práticas como “perigosas” porque de algum modo o edifício estará mal embasado. Não por acaso a Alquimia valoriza os Quatro Elementos como uma construção do Ser completo. Ou seja: de que adiante alguém querer meditar, se o Elemento “Ar” (que é o Plano Mental) apenas acontece de fato sobre a base dos restantes?! Buscar meditar sem outras práticas –e não necessariamente este conjunto acima dado- se assemelha um pouco ao ensino ocidental excessivamente intelectualizado que apenas serve para alimentar as mazelas do próprio plano mental, como orgulho e frieza, e que, estes sim, são atributos clássicos dos magos negros...
Costumamos afirmar que os tempos de Blavatsky eram culturalmente verdes, imaturos. E isto não apenas nas Ciências, mas também no próprio trato da espiritualidade. O preconceito era muito grande e a crendice não menor. Nas chamadas “Cartas dos Mahatmas” podemos ler por exemplo o seguinte.
“O Ocultismo não é uma brincadeira. Exige tudo ou nada. O processo de autopurificação não é obra de um momento, nem de meses, mas de anos, e pode prolongar-se por toda uma série de vidas.”
Nitidamente tem-se aqui a formulação de um tabu, falando objetivamente, colocando um obstáculo ao aspirante de uma via de conhecimento. É evidente que este tipo de “admoestação” não apenas desencoraja as pessoas como ainda estimula a acomodação em formas mais simples de místicas.
Soa notório que as abordagens de Blavatsky -que foi a grande mentora intelectual do movimento teosófico- são pobres em alusões a um esoterismo solar, pese ser característico do esplendor da raça Árya, haja vista as leituras reducionistas que traz do assunto em sua Doutrina Secreta em relação às Estâncias de Dzyan. Em outra passagem, diz HPB:
“O mundo ainda não está preparado para entender a filosofia das Ciências Ocultas. Que eles se assegurem, antes de tudo, de que há seres em um mundo invisível, sejam Espíritos dos mortos ou Elementais; e que há poderes ocultos no homem, que são capazes de fazer dele um Deus na Terra.”
Certamente o Ocultismo se destina a “forjar deuses”, mas isto também deve ser celebrado como algo muito positivo. Por quê razão HPB sustentava tantos preconceitos? Uma das explicações estaria no fato dos primeiros teósofos haverem se associado intimamente a Brahmanes da Índia portadores destas visões. Um exemplo é o preconceito contra o Hatha Yoga (uma prática comum entre a casta dos sudras) que apesar de integrar as práticas clássicas da Yoga (ao menos desde Patânjali) era mal visto pelos teósofos em detrimento de uma Raja Yoga puramente meditativa. Esta é uma das distorções resultando da estratificação do sistema de castas da Índia, posto que nas origens as castas não estavam ligadas ao nascimento mas ao estágio de consciência sendo ademais cumulativas segundo a vocação.
De todo modo, também seria possível encontrar associações especiais entre Gupta Vidya com algumas destas disciplinas acima classificadas -este será o tema do nosso próximo Capítulo. Naturalmente outras abordagens são possíveis. A nossa Série “A Tradição Árya” representa uma espécie de “Doutrina Secreta” (ou Gupta Vidya) com uma hermenêutica esotérica realizada diretamente sobre a própria Tradição Hindu (devidamente enriquecida por enfoques ecumênicos), sem passar pelas interpretações -positivas ou negativas- realizadas pela Teosofia de Helena P. Blavatsky. A ênfase dada à questão social, reflete apenas a importância central deste tópico para a própria Civilização Árya.
LAWS, “A Teosofia Científica”, Editorial Agartha.
Leia também “A Doutrina Secreta Revelada”
www.agartha.com.br
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